Ricardo Tomé: "O que vamos ver no futuro"

O seu aparelho liga-se. À sua mercê estão centenas de conteúdos. Não sabe bem quem os fez. Mas gosta do que vê. Não sabe bem quem decidiu estes. Mas agradam-lhe as sugestões. Percebe que têm origem em vários produtores, mas encontra tudo num único interface, o que é bastante cómodo e intuitivo. Ainda se lembra como tudo era há 10 anos atrás, em 2020 – tinha de saltar de app em app como a do YouTube, do Netflix, do seu operador cabo ou de um OTT nacional como o TVI Player, para poder escolher o que ver. Agora o algoritmo agregador-mor simplifica-lhe a vida. E você agradece. Tem tudo num único ecrã. Todas as suas subscrições ativas, recomendações de outras, os canais que ainda existem (saudades de muitos que, entretanto, desapareceram…) e a parca oferta vídeo à peça (outrora até lhe dava algum uso, chamavam-lhe ‘Videoclube’). Hoje, em 2030, vê muitas das estreias de cinema de forma regular diretamente por via digital, em casa. Paga o “bilhete” porque quer ver quanto antes, ainda que volta e meia se desloque à sala de cinema para confraternizar em família ou amigos no novo Star Wars ou nova vaga da Marvel. O seu filho pergunta-lhe como “era antigamente”, e tem até alguma dificuldade de se recordar dos pormenores, de tal forma 10 a 15 anos lhe parecem já tão distantes.

O enquadramento serve mais o propósito do “onde vamos ver no futuro”, mas tamanho pormenor é um “pormaior”, pois o contexto do consumo influenciará também qual é e como será o conteúdo. Sempre o fez e sempre o fará.

Recordemos, pois, o passado para corroborar esta ideia. Em 1950 a Zenith Radio Corporation criou o primeiro comando remoto para os televisores (ainda com fio, pois claro!). Deram-lhe o original nome de “LazyBones” (Preguiçoso). E com isto, mais do que facilitar o ajuste de canais e corte do som, provocaram um terramoto na indústria televisiva. No que até aí era um esforço – mudar de canal – passou a ser um hábito treinado como especialidade olímpica: fazer o varrimento de canais. O chamado zapping passou a ser a nova norma. Com isto, toda uma indústria teve de se reinventar. Se os programas até aí eram lentos na sua edição e narrativa, desprovidos de enquadramento sonoro que os tornasse mais excitantes, obrigou, portanto, à escolha de novas ideias mais empolgantes e maior edição sonora e de realização mais vigorosa. Cada 20 segundos eram uma etapa a ser ganha, antes que o instável e insatisfeito espectador se lembrasse de mudar de canal.

Décadas depois, a revolução mobile iniciada verdadeiramente com o lançamento do iPhone em 2007, arrasou com todas as convicções. É apenas mais uma forma de aceder à internet, pensaram alguns. Vai mudar tudo, pensaram acertadamente uns poucos. Os novos ecrãs, num contexto pessoal e num consumo em mobilidade, vieram demonstrar que a produção de conteúdos teria de se adaptar: conteúdos filmados na vertical, pensados nos enquadramentos para dimensões pequenas e de durações entre 1 a 15 minutos (mobile = portável = em movimento). O contexto, uma vez mais, determinava uma nova forma de produção e orientação criativa, bem como de consumo.

Mas voltemos ao nosso futuro próximo. Deixámos de ligar tanto aos ecrãs. Para nós o conceito de Televisão é tudo. Por vezes damos por nós, os mais velhos, a contar aos mais novos o que era isso da televisão, a televisão do televisor. Hoje o conceito é mainstream. Não interessa a particularidade. Consumo de entretenimento em vídeo é televisão. A dúvida deu origem ao novo normal. E este recheia-se de soluções antigas como de novas.

Vejamos. Não precisamos de grandes quadros estatísticos para nos dizerem que hoje a televisão chega à quase totalidade da população. Mas que televisão? Aquela que é entregue por que meio? Falamos naturalmente da difusão TDT e por Cabo. Em segundo plano, claro está, seguem as ofertas por via internet, os chamados Over-The-Top (OTT), tais como os já mencionados YouTube, Netflix ou TVI Player, bem como tantos outros. Para estes não há barreiras. Precisa apenas de 3 componentes: um dispositivo eletrónico com capacidade de ligar à internet, uma ligação ativa à internet e tempo disponível. Nalguns deles, precisa ainda de uma 4.ª componente: aquele cartão rígido de plástico que lhe autoriza uma ligação à sua conta bancária, e assim cedendo alguns euros por mês para subscrever e assistir ao conteúdo limitado/pago.

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