Resistência e Fé: A História dos Kakure Kirishitan em exposição na Universidade Católica
No dia 2 de dezembro, a Universidade Católica Portuguesa (UCP) inaugurou a exposição fotográfica "Kakure Kirishitan – Cristãos Ocultos", dedicada aos cristãos que viveram a sua fé em segredo no Japão durante mais de 200 anos, sob a perseguição religiosa imposta pelo Shogun Tokugawa.
A cerimónia de inauguração começou com uma visita guiada da exposição na Biblioteca Universitária João Paulo II, seguida por uma sessão no Auditório Cardeal Medeiros.
Peter Hanenberg, Vice-Reitor da Católica, destacou como a exposição retrata a resistência dos cristãos japoneses, forçados a viver em esconderijos para preservar a sua fé. "Mais de 200 anos na clandestinidade, sem poder praticar publicamente a sua fé, esta é uma experiência que mostra tanto a resiliência da nação como a necessidade de dar liberdade à sua expressão", afirmou Peter Hanenberg, enfatizando que a exposição é guiada pelas palavras "passado e presente" e "fé e liberdade". "Não é possível uma verdadeira vida de fé sem a liberdade da fé. Mas também não há liberdade possível sem o poder e a resistência da fé".
Também Dom Ivo Scapolo, Núncio Apostólico em Portugal, destacou a relevância da memória coletiva e do estudo da história para a construção do presente. “A nossa celebração pode, decerto, ser uma celebração apoiada e iluminada e inspirada pela memória. Mas é uma memória viva, é uma memória que escacara horizontes de futuro e de esperança.” Para o Núncio Apostólico, a memória dos cristãos escondidos é uma força de resistência que inspira os cristãos atuais.
O Embaixador Ota Makoto, Representante do Japão em Portugal, fez questão de destacar a importância da exposição para fortalecer os laços históricos entre o Japão e Portugal. "É uma grande honra ver a Universidade Católica Portuguesa acolher esta exposição, que não só celebra a história dos cristãos ocultos, mas também simboliza a amizade duradoura entre os nossos países", afirmou.
A cerimónia contou também com a intervenção de Jorge Santos Alves, Coordenador do Instituto de Estudos Asiáticos da Católica, que referiu: “Estamos a celebrar os 450 anos da passagem da missão Tenshō por Portugal, um legado extraordinário que nos permite conhecer as dinâmicas das trocas culturais no início do mundo moderno”, sublinhando a importância da exposição para a compreensão das trocas culturais entre os dois mundos.
"Durante quase 260 anos de perseguição, os cristãos enfrentaram a escolha entre abandonar sua fé ou escolher o martírio", recordou o Arcebispo Emérito Takami, da Arquidiocese de Nagasaki. Takami enfatizou que, apesar das condições adversas, os Kakure Kirishitan mantiveram viva a sua crença, transformando dor em esperança através da oração e da fé inabalável.
Mais do que uma exposição, para Tatsuo Shirahama, Presidente da Fundação Yumenosya, esta mostra é uma mensagem de resistência, fé e sobrevivência que transcende o tempo.
“Como descendente da terra judaica, dos cristãos ocultos do Japão e sobrevivente de segunda geração do bombardeamento atómico de Nagasaki, esta herança, este algo com que nasci, foi sempre a inspiração e a força motriz por detrás do trabalho que hoje faço para a Fundação Yumenosya. Yumenosha, não estamos apenas a preservar a história, mas a construir esperança”, partilhou, explicando a sua profunda ligação com esta história de resiliência.
Segundo Dom Rui Valério, Magno Chanceler da Universidade Católica, esta vivência da fé cristã no Japão, marcada pela clandestinidade, remete para o espírito missionário de Portugal, que, mesmo em tempos de grande dificuldade, nunca abandonou a fé e o compromisso com a verdade do Evangelho. “Quantos não são aqueles que vivem o cristianismo, vivem o evangelho, mas de uma forma tão discreta e nada oficial, os seus nomes não constam em nenhum registo oficial de paróquias ou de dioceses".
Durante a cerimónia, Dom Ivo Scapolo ofereceu um Atlas ilustrado sobre os Kirishitan ao Instituto de Estudos Asiáticos, contendo mais de 1.500 ilustrações e documentos que testemunham a resistência dos cristãos durante a era da proibição religiosa no Japão.
A inauguração culminou com uma performance da Tokyo Opera Association, com 35 cantores a interpretarem peças dedicadas aos cristãos ocultos.
A exposição, que estará aberta até ao final de janeiro de 2025, oferece aos visitantes uma oportunidade única de refletir sobre a perseverança, fé e liberdade ao longo dos séculos e das culturas. Como realçou o Vice-Reitor Peter Hanenberg no seu discurso inaugural: “Estes dois pares de palavras, o presente e o passado, a fé e a liberdade, mostram, numa exposição muito pequena, tudo o que é a humanidade, os desafios da humanidade, viver entre o ontem, o hoje e o amanhã, viver entre a crença e a liberdade”.