Francisco Cabral em Melilla

Francisco Cabral, 22 anos e estudante de Pós-Graduação em Gestão de Projetos e Cooperação para o Desenvolvimento, na FCH, rumou até Melilla, onde fez voluntariado com a organização “Mec de la Rue”.


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Antes de começar a minha experiência de voluntariado, sentia-me algo ansioso por ir trabalhar com pessoas com um percurso tão particular e sensível, que realmente precisam de ajuda sistemática e especializada. Trabalhar com jovens migrantes é, de facto, uma realidade dura e complexa. No entanto, toda a formação que recebemos antes, através do programa, ajudou-me a ir melhor preparado. Acredito que essa preparação inicial foi fundamental para atenuar as incertezas e para enfrentar os desafios com mais confiança.

As nossas atividades no terreno consistiam sobretudo, durante o período da manhã, na preparação das tarefas diárias e em reuniões de equipa. Pela tarde, dedicávamo-nos a dar aulas de espanhol, facilitando a integração dos migrantes recém-chegados. À noite, envolvíamo-nos na confeção e distribuição de refeições, uma tarefa que unia voluntários e migrantes em torno de uma causa comum. Aos fins de semana, organizávamos atividades lúdicas e de integração, como jogos de futebol na praia ou peddy-papers. Realizar todas essas atividades foi uma verdadeira fonte de alegria, e os laços criados durante esses momentos são profundos e duradouros – até hoje mantenho contacto com várias das pessoas que conheci.

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Uma das experiências mais marcantes aconteceu quando o meu voo de regresso a casa foi adiado por dois dias. O que poderia ter sido uma situação desagradável transformou-se numa das melhores memórias que carrego comigo. Os voluntários locais acolheram-me de forma fraterna e calorosa, e, para além disso, a associação tinha começado a renovar o seu espaço com pinturas. Decidi juntar-me aos migrantes que estavam envolvidos nesse projeto. Foi um momento de celebração e de profundo simbolismo. Naqueles dias, éramos todos iguais – as nossas histórias pessoais, por mais distintas que fossem, não importavam. Estávamos unidos no propósito de criar um espaço melhor e mais acolhedor para os que viriam a seguir. É disso que se trata a verdadeira humanidade.

O impacto positivo do programa de voluntariado na comunidade de migrantes foi ímpar. Os jovens mostraram uma enorme vontade de aprender e de se integrar. Todo o carinho e fraternidade que lhes demos foi retribuído de forma generosa. Todos nós, voluntários e migrantes, crescemos juntos. Ver os jovens partirem para a península carregando sonhos e esperanças foi um dos momentos mais felizes da minha experiência – saber que contribuímos para abrir novas oportunidades é de um valor incalculável.

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No entanto, nem todas as situações eram felizes ou fáceis de processar. As histórias que estas pessoas carregam são únicas, pessoais e, muitas vezes, incrivelmente duras. Lembro-me do relato de um jovem de 15 anos que nadou durante oito horas para chegar a Melilla, perdendo o seu melhor amigo no processo, ou de um jovem de 24 anos que atravessou cinco baías, cada uma com sete metros de arame farpado e enormes valas entre elas, sob forte vigilância, enfrentando a violência da polícia em ambos os lados. Esta é a "fronteira da vergonha", como é conhecida localmente. Ouvir estas histórias pessoalmente é muito diferente de vê-las na televisão – dar-lhes rostos e nomes torna tudo mais real e doloroso. Este é o ponto que acredito ser fundamental lembrar: estas histórias não são estatísticas, são vidas humanas. Este voluntariado é sobre humanidade.