Vacinação para o CoronaStress

Regular o voltímetro das nossas emoções em tempos de COVID 19

Em tempos de confinamento até pode parecer que conseguimos suprimir o stress: o dos pequenos almoços a correr, o de deixar a nossa criança a horas na escola, o de chegar ao trabalho sem atraso, o das filas de trânsito, etc. etc. -  enfim, os episódios de stress agudoque povoavam a nossa semana de trabalho. Sendo realmente experimentado por quase todos como desagradável, este tipo de stress não é o que tem piores consequências, se os episódios forem curtos e não muito repetidos. O stress é uma resposta adaptativa que acionamos e que nos coloca com o foco e a energia necessários para enfrentarmos atividades exigentes, que no contexto em que falamos são estes os nossos desafios do dia a dia. O stress agudo, por definição de curta duração, é uma faca de dois gumes: pode ser produtivo, e até pode acelerar a cicatrização, como mostram alguns estudos; mas um intenso episódio de stress agudo, como o desencadeado pelo horror de uma cena de sofrimento e morte, como algumas que nos chegam pela televisão e pelos media virais, também pode desencadear uma cascata de reações que culminam em acidentes cardio-vasculares. 

Há um outro tipo de stress, bem mais insidioso, que se instala na nossa existência sem darmos por ele, e que tem efeitos perniciosos e de longa duração – o stress crónico. Este tipo de stress resulta duma inquietação permanente, ou tão frequente que são insignificantes os intervalos entre os seus momentos. Na vida moderna e na sociedade em que vivemos, o stress crónico é um estado de preparação constante para uma ameaça que nunca se vai embora: a de não conseguir pagar as prestações ao banco, a renda da casa, o colégio dos filhos, as dívidas aos credores…e agora, a preocupação constante com a ameaça que paira sobre todos – a doença nova de comportamento imprevisível e incompreensível, a crise económica e a incerteza do futuro. A informação que nos chega pelos vários canais gera ansiedade e tristeza. 

E as notícias que nos chegam pelo canal visual são particularmente poderosas – são as que têm mais efeito no desencadear de emoções – porque enquanto seres humanos esse é o nosso canal sensorial preponderante, efetivamente na base de um despoletar de reações que não conseguimos impedir. A simples visualização dum filme tem a capacidade de alterar o nosso estado de humor, a nossa motivação e os nossos níveis hormonais, ao final de 20-40 minutos como diversos estudos mostram. Porque as imagens têm todo este poder – devemos controlar aquilo de que somos espetadores – evitando a indução excessiva de ansiedade e emoções negativas e sendo proativos a selecionar filmes, programas e mesmo notícias que nos orientem para estados mais positivos. 

Por falar em notícias - há outro efeito que devemos evitar – o  gerado pela repetição. A repetição das notícias amplifica o seu impacto. A notícia pode ser sempre a mesma, mas a exposição repetida gera um efeito de familiaridade, que enviesa a nossa perceção da realidade. Ver uma vez o cenário dramático do empilhamento de caixões em Itália, não é o mesmo que o ver 5 vezes num único dia. O nosso cérebro processa implicitamente essa repetição, multiplicando efetivamente o peso daquela informação e a extensão da calamidade. A pessoa, assim exposta às notícias, vai ter mais medo do que o medo razoável e adaptativo. E com o passar do tempo este stress crónico é literalmente corrosivo para o bem-estar: o cortisol libertado durante o stress é neurotóxico e destrói tecido neural, e o indivíduo vai-se assemelhando, cada vez mais, a alguém com stress pós-traumático.

Mas atenção, não vale a pena mergulhar de cabeça no hedonismo puro – a ideia não é ficar a ver comédias e presentearmo-nos com guloseimas e belas imagens. É controlar estes efeitos não conscientes no cérebro e no estado de espírito; é procurarmos mais informação escrita e menos visual, dirigida às questões e preocupações específicas que queremos ver respondidas, em websites imparciais e sóbrios, como o da OMS. A estratégia de regular proativamente o voltímetro das nossas emoções, manter-nos-á objetivos e prudentes, menos alienados (e sim, talvez menos alegres) do que aqueles que ainda estão em negação da probabilidade de contágio do COVID-19 e da gravidade possível da doença. Fiquem muito bem, com óculos ligeiramente cor-de-rosa, em tempos de COVID-19.

Augusta Gaspar, Coordenadora da Área Científica de Psicologia

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