Rui Armindo Freitas: “A universidade é um lugar de liberdade.”

Rui Armindo Freitas é Secretário de Estado Adjunto da Presidência e Imigração e licenciado em Economia pela Católica Porto Business School. Sobre o cargo que atualmente desempenha no XXV Governo Constitucional, afirma: “Quando somos chamados a servir o país, é difícil dizer que não.” Natural de Guimarães e deputado municipal há 20 anos, defende uma política próxima das pessoas: “Faço sempre questão de conhecer o terreno, qualquer que seja a função.” Nesta entrevista, fala sobre o papel das universidades, a importância de governar com visão de futuro e deixa ainda uma mensagem para os estudantes que agora iniciam o seu percurso no Ensino Superior.

 

Quais as suas memórias de infância?

Tenho uma memória bastante viva desde muito cedo. A minha infância foi feliz, cheia de brincadeiras. Desde pequeno que comecei a gostar, ou talvez a gostar ainda mais, das coisas que hoje me interessam. Era uma criança muito curiosa, especialmente por tudo o que dizia respeito à política, ao ativismo e até à atividade empresarial. Acompanhava muito de perto o meu pai, que estava ligado ao setor têxtil no Vale do Ave, e isso deu-me um contacto muito precoce com o mundo do trabalho.  Desde cedo tive também interesse pela política e pelo que se passava à minha volta. Lembro-me, por exemplo, de ter sido muito ativo, em 1991, na resposta ao massacre de Santa Cruz, em Timor-Leste. Também sempre tive uma ligação muito forte à minha cidade, Guimarães. Quem é de Guimarães costuma ter esse orgulho bairrista e eu cultivei-o desde sempre.

 

É licenciado em Economia. Porquê escolher a Universidade Católica para estudar?

A escolha da Católica foi natural porque, na altura, era uma Escola que já se destacava no Norte na área da Gestão, com uma visão muito contemporânea. A empregabilidade dos cursos da Faculdade de Economia e Gestão, atual Católica Porto Business School, era muito alta, e existia um serviço de apoio ao aluno e às carreiras que fazia realmente a diferença. Ao longo do percurso académico, há sempre professores que nos marcam, nem sempre são os mais óbvios ou os das cadeiras mais centrais, mas aqueles com quem criamos ligações especiais e memórias que ficam. Na Católica, sentia-se um ambiente de grande proximidade. Havia uma relação muito humana com toda a estrutura da Universidade. O Sr. Américo, por exemplo, que trabalhava na Secretaria, conhecia os alunos todos pelo nome. O Professor Carvalho Guerra também é uma pessoa muito marcante e com uma relação próxima com os alunos. Era um ambiente muito próximo e muito familiar.

 

Ao longo da sua vida profissional passou por vários setores de atividade e também esteve sempre ligado ao associativismo. O que é que o move?

Sempre estive ligado ao mundo associativo, talvez por feitio. Essa ligação levou-me, naturalmente, a envolver-me também na política, sempre numa perspetiva de participação cívica. Nunca tive cargos executivos na política, a não ser agora, numa fase da minha vida em que tenho a independência necessária para o fazer com sentido de missão. É isso que me move hoje: um verdadeiro sentido de missão. Servi o XXIV Governo Constitucional e agora o XXV e parei tudo na minha vida para aceitar esse desafio. Quando somos chamados a servir o país, é difícil dizer que não. Mesmo durante os meus anos na Católica, participei na associação de estudantes e estive ligado à juventude partidária do partido em que milito desde muito novo. Fui convidado a filiar-me ainda jovem, e senti esse chamamento. No fundo, o mais importante nos negócios, na política e no associativismo são sempre as relações pessoais, a forma como gerimos as pessoas e nos relacionamos com elas. Os diferentes setores por onde tenho passado têm desafios específicos, mas o essencial é comum: as relações humanas. Os problemas resolvem-se mais facilmente se conseguirmos estabelecer boas relações e encontrar soluções em conjunto.

 

Quando o desafiam é difícil dizer que não?

Sim, muito difícil. Tenho essa dificuldade, porque, quando alguém nos pede ajuda, sinto naturalmente esse chamamento. Quando assumi funções em exclusividade, tive de renunciar a 16 entidades onde colaborava, irmandades, associações e outras organizações. Sempre tive esse impulso: “É preciso ajudar? Então vamos lá.” Foi sempre um traço do meu carácter.

 

Enquanto Secretário de Estado, toma decisões com impacto nacional. Como encara essa responsabilidade no seu dia a dia?

Sou católico e tendo, também, passado pela Universidade Católica, carrego uma matriz que vai além da fé, uma matriz social, ideológica e filosófica, que tem muito a ver com a doutrina social da Igreja. Essa tradição cristã está na base da nossa cultura ocidental, do nosso Direito, da nossa Economia. Mas acredito que uma visão sólida da sociedade, assente em valores claros, ajuda-nos a tomar decisões. Muitas vezes são decisões difíceis e devemos ter sempre consciência de que, no fim da cadeia de decisão, está uma pessoa. E essa decisão pode ter impacto profundo na vida dessa pessoa. Por isso, o objetivo deve ser gerar o maior impacto positivo possível para o maior número de pessoas possível. Claro que nunca se consegue agradar a todos, não existe uma solução perfeita. Mas devemos procurar otimizar, encontrar um equilíbrio que beneficie o máximo número de pessoas. Essa é a grande dificuldade da política: manter os olhos no futuro, mesmo enquanto resolvemos os problemas do presente. Governar é também lançar as bases do que virá.

 

Governar para o presente e para o futuro…

Sem dúvida e não há um manual para ser membro do Governo. De tudo o que fiz na vida, esta é a função mais desafiante. Não há um playbook. Olhamos para o nosso percurso e é ele que nos dá a visão para o futuro. O governante tem de olhar para o dia de hoje, mas sem nunca esquecer que tem de lançar as bases para o futuro.

 

Que papel tem a política de proximidade na sua visão de serviço público?

Hoje sou Secretário de Estado Adjunto da Presidência e da Imigração. E não há forma de tomar decisões difíceis sem contacto direto com a realidade. Faço sempre questão de conhecer o terreno, qualquer que seja a função. É fundamental perceber a realidade concreta que estamos a tentar regular ou transformar. Por vezes, recebemos críticas de quem olha para os assuntos de forma superficial, como se tivesse o mesmo grau de certeza de quem se debruça verdadeiramente sobre as questões. A política tem de ser feita com proximidade, com conhecimento real dos problemas. Sabemos que não conseguimos resolver tudo para todos, mas temos de tentar resolver o máximo possível, com responsabilidade.
No meu caso em particular, continuo, também, a intervir na política local. Sou deputado municipal em Guimarães há 20 anos. Continuo atento a tudo: desde a taxa da água ao orçamento autárquico, à requalificação de uma estrada que pode dinamizar a economia local. Sempre o fiz com paixão. Sou profundamente ligado à minha terra, ao Vale do Ave e à história da indústria têxtil, que é uma das bases da nossa economia e identidade.

 

O que é que a região tem de especial?

São as pessoas e a sua capacidade de trabalho. Eu acho que, no fundo, são sempre as pessoas. As pessoas são sempre um fator determinante em tudo. O espaço não é nada se não for habitado. São as pessoas que lhe dão a sua característica. Mais do que as pessoas que estão agora, são as pessoas que nos antecederam. São as pessoas que foram construindo a História antes de nós, que foram moldando a nossa forma de ver o mundo. Olhando para o Vale do Ave, olhando para Guimarães, é uma região e uma terra de gente que trabalha, de gente que nunca vira a cara à luta. Nesse chão comum do trabalho, os que não viram a cara à luta têm uma forma muito aguerrida de estar em tudo, na forma como se apresentam ao país, sempre com muito bairrismo e muita força. Ninguém fica indiferente. É, de facto, uma cidade que foi Capital Europeia da Cultura em 2012 e continua a marcar claramente aquilo que é Portugal. Toda a gente tem noção daquilo que ali está. O Vale do Ave foi o berço da revolução industrial em Portugal, no século XIX. Uma revolução industrial tardia, mas que parte dali. E foi dali que muito do que é hoje a economia portuguesa acabou por nascer.

 

Como é que olha para o papel das universidades em Portugal?

Há um desafio que ainda temos de ultrapassar, que é o dos contágios entre o mundo universitário e o tecido económico. Já muito foi feito. Nos últimos vinte anos, a realidade mudou completamente. A academia era uma coisa e os agentes económicos outra. Felizmente, hoje já não é assim. Ainda assim, acho que devia existir um contágio maior. As universidades nunca devem perder o que às vezes se perde com a aceleração da comunicação, das redes sociais e dos muitos interesses. A universidade nunca se pode esquecer que é um espaço de debate, um espaço livre de opinião, um espaço onde deve existir capacidade crítica para poder ajudar a construir a sociedade. Esse, sim, é um papel fundamental das universidades. Do ponto de vista político, a universidade é um lugar de liberdade, mas deve ser também um polo de evolução e de contestação. As universidades devem pôr tudo em causa. Temos de questionar mais. Gostava que não existisse uma diferenciação entre aqueles que bebem da primeira água do conhecimento científico e depois outros que só vão ler o que vem de livros produzidos noutro sítio qualquer. Queria que todos questionassem. Olhe-se, por exemplo, para o caso da Católica, tem uma academia com pessoas extraordinárias. Essa massa crítica tem de ser aproveitada pela sociedade no seu potencial. É aí que eu vejo o futuro da universidade, na capacidade de refletir a sociedade e as soluções. Não ter medo de inovar. Não ter medo de falhar e voltar a fazer. Não ter medo de pensar em conjunto.

 

O que é que ambiciona para Portugal?

Depois de um ano em funções, vejo dificuldades que talvez no primeiro dia não imaginasse que existissem. Contudo, venho trabalhar todos os dias com a mesma energia do primeiro dia. E não vou esmorecer. Desde logo, sou de Guimarães (risos). O que é que eu quero e ambiciono? Fundamentalmente, quero deixar aos meus filhos um Portugal melhor do que aquele que recebi. Com mais rendimento, mais poder de compra, uma economia mais desenvolvida, mais produção científica, melhor qualidade de vida, mais crescimento. Vejo em Portugal características de um país extraordinário. Nós somos um povo extraordinário. Portugal é um país com uma força que tem de ser mais despertada. Nós conseguimos provar que temos dos melhores em todas as áreas. Temos sempre o melhor. Mas o que seria ótimo era que todos fôssemos muito bons em média. Ou seja, o desafio é elevar a média: a média das competências, a média da qualidade, a média daquilo que fazemos. Os muito bons nós já os temos. Já nos inspiram. E, de facto, somos um país que, pela sua posição estratégica, pela sua história multicultural, pela sua ligação ao mundo (fomos sempre um país globalista, aberto ao mundo) temos um papel fundamental.

 

É otimista?

Sempre otimista. Nós somos extraordinários. Estive na Católica há duas semanas e pude ver que aquilo que fazem é extraordinário. Mas, felizmente, não são os únicos extraordinários. Há mais extraordinários. Há muitos extraordinários em Portugal e por isso não posso não ser otimista quanto ao nosso país. Saibamos pegar no potencial de Portugal e convertê-lo. Também não podemos viver só de potencial, só de esperança, só de orgulho. O grande desafio é converter esse potencial em algo concreto.

 

Milhares de jovens acabaram de ingressar no Ensino Superior. Que conselho daria a estes jovens que agora começam a sua vida universitária?

Vão iniciar a etapa mais extraordinária da vida deles. É uma etapa que vai moldar aquilo que eles vão ser. O primeiro dia da universidade ninguém esquece. Ninguém se esquece da noite anterior ao primeiro dia. Aquelas borboletas na barriga (risos). Que vivam este percurso universitário com a certeza de que, quando saírem, serão muito melhores. Assim haja esforço e dedicação, tudo se vai alinhar para uma vida que tem tudo para ter sucesso.

 


Pessoas em Destaque é uma rubrica de entrevistas da Universidade Católica Portuguesa, Centro Regional do Porto.

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