Francisco de Assis Parcerias: “Cada filme precisa de nascer de dentro de mim.”

Francisco de Assis Parcerias

Francisco de Assis Parcerias é licenciado em Cinema pela Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa no Porto. O seu filme Valsas na Lua foi distinguido em vários festivais, entre eles o New York Portuguese Short Film Festival e o Cinalfama. Fascinado pelo cinema desde criança, na Escola das Artes, sentiu-se “imediatamente em casa”.

Porquê estudar Cinema?

Segui aquilo que acreditava que me faria mais feliz. Desde muito novo que adorava ver filmes. Obviamente, o meu fascínio não começou com filmes do Bergman ou do Kubrick, mas com a Guerra das Estrelas, que via com o meu pai.  Com cerca de doze anos disse à minha mãe que queria ser realizador, apesar de não saber o que um realizador fazia. Desde aí que não mudei de ideias.

“Na Escola das Artes, senti-me imediatamente em casa”

De onde surge a sua ligação ao mundo das Artes?

Foi precisamente na Escola das Artes da Católica. Antes disso, fui um estudante de humanidades, muito tímido e todos os meus amigos da altura eram os meus colegas de turma. Por isso mesmo, o ambiente da Escola das Artes e, em particular, o ambiente da minha turma foi bastante fascinante. Até aí, não tinha ninguém (ou muito pouca gente) com quem partilhar o meu interesse pelo Cinema. Senti-me imediatamente em casa, rodeado dos meus pares.
 

Que aprendizagens mais o marcaram na Escola das Artes?

Principalmente as cadeiras de projeto, com a discussão crítica entre alunos e professores. Foi ainda muito marcante o envolvimento de professores convidados nos nossos projetos. Destaco, particularmente, o Sandro Aguilar e o João Canijo - além de terem filmes impressionantes, foram professores admiráveis. O que também me marcou na Escola das Artes foi a pluralidade entre as diferentes cadeiras e anos. Creio ser impossível sair-se da Licenciatura com uma visão fechada do Cinema.

“Cada filme precisa de nascer de dentro de mim, com tanta força que não o possa evitar.”

Durante os 3 anos de licenciatura, desenvolveu diferentes projetos...

Um dos projetos que mais me marcou foi o primeiro de todos. Foi a primeira vez que realizei alguma coisa. Ficou horroroso, hoje não deixo ninguém ver aquilo. Olho para trás e vejo que ninguém teve culpa do resultado - éramos novatos. No segundo semestre, fui “obrigado” a realizar outra vez. Fiz aquilo contrariado, com medo que algum outro professor pusesse olhos nas asneiras que estava a fazer. Contudo, os professores foram muito elogiosos e saí de lá muito orgulhoso.
Quando comecei o segundo ano, via-me como um Midas, ou o Goldfinger. Mas percebi que isso estava a léguas de ser verdade. Percebi mais ainda que fazer um filme não era seguir um livrinho de receitas. Que cada filme precisava de nascer de dentro de mim, com tanta força que não o possa evitar. E que se o forçar, não é uma ideia, mas sim fanfarronice. Foi entre o segundo e o terceiro ano, quando comecei a escrever o Valsas na Lua, que percebi que tinha de mudar de atitude.
 

O filme Valsas na Lua foi selecionado para vários festivais de Cinema.

Cada seleção foi sempre uma surpresa. No início da “vida” do projeto recebemos tantos “nãos” que quando um “sim” apareceu fiquei completamente atarantado. Ainda por cima no New York Portuguese Short Film Festival. A única Nova Iorque que conheço é a dos filmes do Scorsese. Mas um filme que realizei passou no Lincoln Center e isso fez-me imensamente feliz. Quando recebemos a notícia de que o filme fora selecionado e que tinha ganho uma categoria no Cinalfama foi novamente uma surpresa enorme. Esse festival foi muito bonito. Foi a nossa estreia em Portugal e uma boa parte da equipa foi até Lisboa para assistir. Acho que não houve momento da minha vida em que me sentisse tão realizado. Foi maravilhoso.
Este mês, dia 20, o filme vai ser exibido pela primeira vez numa sala de Cinema em Portugal, no Festival Caminhos do Cinema Português. Estou muito ansioso para ver como vai correr.
 

Fotografia do Evento

Como foi o processo criativo e de produção do filme Valsas na Lua?

O processo criativo do projeto foi muito natural, principalmente com a orientação do João Canijo. Tratou-se de procurar como esta história exigia ser contada e, de certa forma, procurar também os filmes que mais me influenciam. Apesar de se tratar de uma autoficção, naturalmente que este projeto nascia de uma mixórdia entre os meus filmes favoritos e a minha experiência de vida. Para além disto, contei com a colaboração do Matias Ferreira (diretor de fotografia, montador e amigo) e com quem tenho muitas ideias e inspirações partilhadas, como o Aftersun, da Charlotte Wells.
 

Ao longo da licenciatura, colaborou em vários projetos com colegas. Qual a importância da colaboração?

Pelo menos para mim, é muito comum e muito valioso. Muitas vezes, é difícil sairmos das nossas cabeças por um bocado. A colaboração permite-nos perceber, muitas vezes, que as nossas ideias são verdadeiramente bastante parvas. Talvez seja por isso que muita gente gosta de trabalhar o mais sozinho possível e rotular as suas ideias de “demasiado particulares”. Não há nada de particular numa ideia. Se houvesse, não eram partilhadas e entendidas fora da cabeça do autor.

 

Qual o segredo para contar uma história em 17 minutos?

Não há segredos, é particularmente simples. Há histórias que têm 17 minutos, outras 7 e outras 70. O primeiro bruto do projeto tinha 23 minutos. Complicado foi perceber que 6 minutos estavam a mais. Apesar de tudo, esta questão foi uma discussão longa durante a produção e depois da produção do projeto. Mas esta história tem 17 minutos.

“Ambiciono poder contar as minhas histórias, exatamente como elas são”

O que ambiciona para o seu futuro profissional?

Ambiciono poder contar as minhas histórias, exatamente como elas são. Também ambiciono vir a dar aulas, quase tanto quanto fazer filmes.
 

Tem novos projetos em vista?

Estou a projetar, no mestrado, uma longa-metragem que partilha uma parte da história do Valsas. Também é sobre uma criança que perde o pai muito nova.
Para além disso tenho uma curta-metragem em mãos, para a qual estou à espera de vir a conseguir financiamento, e é sobre dois amigos que, carentes e miseráveis, se desejam mutuamente. Quero eventualmente debruçar-me mais em histórias sobre amizades, tal como esta. Os amigos são a família que nos acolhe, não deve haver nada mais bonito que isto.
 

Que filme recomenda para quem está a dar os primeiros passos no cinema?

Qualquer coisa do Rosselini. São filmes do mais profundo humanismo, bastante comoventes. Talvez seja apenas quando vejo os seus filmes que sinto alguma esperança num futuro melhor. Na mesma vertente, também recomendo o It’s a Wonderful Life, do Capra. É impossível ver-se algum destes filmes e não querer fazer um que seja nosso.

 


Pessoas em Destaque é uma rubrica de entrevistas da Universidade Católica Portuguesa, do Campus do Porto

Categorias: Escola das Artes

Quinta, 20/11/2025